quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Disciplinamento do Sujeito

Michael Foucault, em Vigiar e Punir, apresenta o corpo como “superfície para o exercício de relações de poder” e saber (Mendes, 2006). É neste cenário que surgem as técnicas de disciplinamento dos corpos dos sujeitos, que, aos estabelecer limites e possibilidades,  visa torná-los mais dóceis e eficientes ao sistema, bem como garantir que o pacto social seja respeitado sob pena de punições das mais severas aos transgressores, como os castigos que garantiriam a domesticação dos corpos indisciplinados tornando-os corpos dóceis. Foucault sintetiza muito bem isso quando afirma que “o corpo só se torna força útil se é ao mesmo tempo corpo produtivo e corpo submisso”.

Disciplinamento do Sujeito

No clássico capítulo “O Corpo dos Condenados” da obra Vigiar e Punir, Foucault traz a história do parricida francês Damiens que fora penalizado a suplício público, com afogamento e esquartejamento por cavalos, por tentativa de assassinato ao Rei Luís XV tido “o pai da França”. O esquartejamento é transcrito nos seguintes termos:

“[Damiens fora condenado, a 2 de março de 1757], a pedir perdão publicamente diante da porta principal da Igreja de Paris [aonde devia ser] levado e acompanhado numa carroça, nu de camisola, carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; [em seguida], na dita carroça, na praça de Grève, e sobre um patíbulo que aí será erguido, atenazado nos mamilos, braços, coxas e barrigas das pernas, sua mão direita segurando a faca com que cometeu o dito parricídio, queimada com fogo de enxofre e as partes que será atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente e a seguir seu corpo será puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros e corpo consumidos ao fogo, reduzidos a cinza e suas cinzas lançadas ao vento” (FOUCAULT, 1987, p. 9)

Ao trazer o relato dos suplícios aplicados ao parricida Robert-François Damiens, Foucault delineia as consequências atrozes, bárbaras, resultantes do descumprimento da relação contratual outrora estabelecida, sob risco de, ao lesar qualquer membro da comunidade, sofrer duras penas corporais, psicológicas. O esquartejamento relatado cumpre a função de disciplinar os corpos dos sujeitos e fixar na memória do transgressor e de toda a comunidade a necessidade de não voltar a cometer infrações, de não lesar o pacto social outrora estabelecido.

Michel Foucault brilhantemente analisou os efeitos do disciplinamento do sujeito na sociedade moderna. De acordo com sua percepção, o uso dos controles disciplinares pelas instâncias educadoras (família, escola, igreja, comunidade, presídios) possibilitou o desenvolvimento de uma subjetividade conformada, moldada aos interesses sociais. Sem os controles disciplinares dificilmente seria possível o controle dos instintos e dos desejos. Dito isso, depreende-se que educar passa pelo processo necessário de repressão, controle dos impulsos e desejos animalescos visando conformar à ordem pré-estabelecida, às exigências sociais.

Assim pensada, a educação, de acordo com Lima (2019) passa a ter a função de domesticar e adaptar o sujeito na sociedade, conformando-o a uma certa normatividade. Com isso a ideia de educar para a emancipação cede lugar à ideia de educar para a subordinação, para a adequação às demandas sociais.

Fábio Guimarães de Castro

Referências Bibliográficas

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 1987.

LIMA, João Francisco Lopes de. A pedagogia, a formação humana e o sujeito narcísico pós-moderno. Revista Educação em Questão, Natal, v.57, n.53, p. 1-19, jul./set. 2019.

MENDES, Claudio L. O corpo em Foucault: superfície de disciplinamento e governo. Revista de Ciências Humanas, Florianópolis: EDUFSC, n39, 2006.

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